Aprendizagem motora de idosos é heterogênea e tem relação com o desempenho cognitivo

Pesquisa propunha tarefa motora feita em um computador para investigar o efeito da aprendizagem autocontrolada.

 

O aprendizado motor é um processo único para cada pessoa e pode se transformar ao longo da vida. Com o envelhecimento, métodos de ensino que funcionam bem para jovens nem sempre apresentam os mesmos resultados para idosos. Foi pensando nisso que Renato Reis de Souza, sob a orientação do Prof. Dr. Flavio Henrique Bastos, investigou como a aplicação do autocontrole de feedback influencia a aprendizagem motora em idosos, levando em conta também o impacto do desempenho cognitivo nesse processo. No método, o aprendiz decide quando e quantas vezes verá seu desempenho após a tentativa de realizar uma tarefa motora. 

A pesquisa constatou que a aprendizagem motora autocontrolada em pessoas idosas é influenciada pelo desempenho cognitivo. Além disso, os dados sugerem que, após os 60 anos, a idade dos aprendizes pode não ser um bom indicador de desempenho, já que os resultados obtidos por cada participante nos testes aplicados não mostraram ter relação com a idade que tinham, ou seja, os voluntários mais novos não tiveram desempenho superior aos mais velhos e vice-versa.

 

Estudo descobriu que o desempenho cognitivo e o aprendizado motor não se associaram à idade - Foto: Marcos Santos/USP Imagens.

Aplicação dos testes e aprendizado da tarefa

Participaram da pesquisa 20 voluntários acima de 60 anos e neurologicamente saudáveis, todos alunos do Curso de Educação Física para Idosos da EEFE. Para a coleta de dados, foram realizadas duas sessões individuais com cada participante no Laboratório de Comportamento Motor da EEFE. Em primeiro momento, os voluntários realizaram o teste de Tempo de Reação de Escolha, com a finalidade de medir seu desempenho cognitivo.  

O teste consistia em observar quatro espaços dispostos de modo horizontal e toda vez que um sinal (“X”) aparecesse dentro de um deles, a tecla correspondente (“z” e “x”  / “,” e “.” ) deveria ser pressionada o mais rápido possível. O sinal só desaparecia após uma tecla ser pressionada e, após alguns segundos, outra tentativa começava. Ao todo, foram 48 tentativas. O sistema registrava quanto tempo os voluntários levavam para responder e se a resposta estava ou não correta.

Na imagem, o botão “,” deveria ser pressionado.

Logo após passarem pelos testes cognitivos, os voluntários iniciaram a aprendizagem motora, que foi feita por meio de uma tarefa de timing antecipatório. A tarefa tinha como objetivo observar um alvo móvel, que durante o trajeto era ocluído, e estimar o momento em que ele iria encostar na linha posicionada no canto direito da tela. Quando achasse que o alvo chegou na linha, o participante devia dar um clique com o mouse.

O processo foi dividido em quatro fases. A primeira, chamada de Baseline, foi composta por 20 tentativas e serviu para familiarizar os voluntários com a tarefa, além de descobrir a medida de desempenho inicial de cada participante. A segunda fase foi realizada logo após a primeira e compreendeu 70 tentativas. Nessa fase, considerada de Aquisição, os voluntários tinham a possibilidade de receber feedback após as escolhas feitas. 

Nas últimas duas fases, o Teste de Retenção foi aplicado. Os participantes realizaram 20 tentativas, sem possibilidade de feedback. O primeiro foi feito logo após a fase de Aquisição – Teste de Retenção Imediato (RETi) – e, o segundo, 48 horas depois - Teste de Retenção Atrasado (RETa).

Após cada tentativa da fase de Aquisição, aparecia na tela uma mensagem perguntando se o participante desejava ou não receber o feedback. Todos foram orientados a solicitar o feedback sempre que achassem necessário. Caso optassem por ver, recebiam uma resposta dizendo se o botão foi pressionado antes ou depois do momento correto e por quantos milésimos de segundo de diferença.

Ao final da fase de aquisição, os voluntários responderam um questionário acerca do feedback, informando em que momentos o solicitaram e por qual motivo. O intuito era compreender se existia uma estratégia utilizada pelos participantes, e qual seria essa estratégia. Além disso, eles também responderam uma escala que media o quão confiante eles estavam de que as respostas dadas no bloco de tentativas seguinte iria alcançar um erro menor que 250 ms, 200 ms, 100 ms, 80 ms, 50 ms, 30 ms e 10 ms. A escala ia de 0 (nada confiante) a 10 (extremamente confiante).

Desempenho dos participantes idosos foi variado

Por meio da análise estatística, o estudo constatou não haver correlação entre a idade dos participantes e os resultados obtidos nos testes que mediram o desempenho cognitivo e o desempenho na tarefa de aprendizagem. Segundo o pesquisador, “Isso sugere que a idade, por si só, pode não ser um indicador adequado para as características cognitivas relacionadas ao envelhecimento, inclusive no que se refere à aprendizagem motora”.

Contudo, o aprendizado foi afetado negativamente pelo tempo de intervalo sem prática, pois houve perda de desempenho nas tentativas realizadas 48 horas após a primeira sessão. Já o desempenho cognitivo se mostrou associado ao número de feedbacks solicitados. No total, 80% dos participantes solicitaram o feedback em mais de 60% das tentativas. Além disso, cada solicitação adicional de feedback resultou em uma diminuição do erro absoluto na fase de Aquisição. 

80% dos participantes solicitaram o feedback em mais de 60% das tentativas - FOTO: Kampus Production/Pexels

De acordo com o pesquisador, trabalhos que investigam os efeitos do autocontrole no aprendizado motor em idosos ainda são escassos e nenhum até o momento havia considerado o impacto no desempenho cognitivo nesse processo. 

Renato explica que grande parte das pesquisas sobre o tema não encontrou diferenças entre usar ou não o autocontrole de feedback no aprendizado motor de idosos. Segundo o pesquisador, um dos motivos para isso ter acontecido pode ser a falta de controle do desempenho cognitivo, já que os resultados de seu estudo mostraram uma alta associação desse fator com o desempenho obtido na aprendizagem da tarefa e nas escolhas feitas pelos participantes. 

“Nossos dados são especialmente importantes pois mostram o quão heterogêneo pode ser o desempenho dos participantes idosos. Dessa forma, conseguimos trazer mais clareza à literatura relacionada à aprendizagem motora em uma condição autocontrolada, podendo auxiliar pesquisas futuras que pretendem investigar esse tipo de aprendizado em pessoas idosas, principalmente se considerarem um indicador de desempenho cognitivo em suas análises”, afirmou Renato.

Os dados são especialmente importantes pois mostram o quão heterogêneo pode ser o desempenho dos participantes idosos - Foto: Paula Bassi.

Intitulado “Desempenho cognitivo e Aprendizagem Motora Autocontrolada em idosos”, o estudo completo está disponível no banco de teses da USP e pode ser acessado clicando aqui.

Por Giulia Rodrigues

Estagiária sob supervisão de Paula Bassi

Seção de Relações Institucionais e Comunicação

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