A influência da poluição atmosférica na prática esportiva

Prof. Rômulo Bertuzzi explica como poluição pode influenciar os atletas, seus treinos e competições.

A poluição do ar é um dos maiores desafios ambientais enfrentados pelas grandes cidades ao redor do mundo, impactando diretamente a saúde pública e o bem-estar dos habitantes. A relação entre poluição e esporte é complexa, e apesar de muitos atletas se adaptarem ao ambiente poluído, as consequências para a saúde a longo prazo têm se tornado tema crescente de estudo, especialmente nas cidades que sediaram grandes eventos esportivos.

Poluição atmosférica na cidade de São Paulo. Foto: Marcos Santos/USP Imagens

O Prof. Dr. Rômulo Bertuzzi, chefe do Departamento de Esporte da EEFE, compartilhou suas opiniões e análises sobre como a exposição ao ar poluído pode influenciar os atletas, seus treinos e competições, além dos estudos acadêmicos que estão sendo realizados na área no momento. 

De acordo com o docente, ainda há muitas incertezas sobre como a poluição atmosférica afeta o desempenho dos atletas. Os estudos mais recentes mostram que, embora o desempenho pode não ser significativamente afetado, outros indicadores de saúde são prejudicados e podem impactar na prática esportiva.  

Impacto no rendimento esportivo

Modalidades que dependem mais do sistema cardiorrespiratório, como corridas de longa distância e esportes aeróbios, tendem a sofrer mais com os efeitos da poluição. Isso ocorre porque os poluentes entram no corpo principalmente por meio da respiração, o que pode alterar a função pulmonar e afetar o metabolismo e o sistema cardiovascular. 

Os atletas que já estão acostumados a treinar em ambientes poluídos parecem se adaptar melhor a esses efeitos. “Os estudos conduzidos na EEFE mostram que esses atletas não são afetados como pessoas destreinadas que moram em ambientes poluídos e as treinadas que moram em ambiente limpo. Eles não têm piora no quadro inflamatório quando estão treinando ou competindo em ambientes poluídos, diferentemente do que vemos em atletas de países com baixa poluição atmosférica”, explica o professor. 

Maratona de São Silvestre realizada na cidade de São Paulo. Foto: Marcos Santos/Imagens USP. 

Medidas de prevenção e desafios socioeconômicos

Embora ainda não existam medidas concretas para mitigar os efeitos da poluição no desempenho dos atletas, estudos iniciais sugerem protocolos como aclimatação à poluição, semelhantes ao que ocorre quando atletas competem em altitudes elevadas. Outra estratégia seria a chegada antecipada às cidades de competição, mas o professor destaca que, do ponto de vista logístico, isso é muito difícil, porque o atleta tem sua rotina e estrutura para treinar e competir no ambiente em que ele vive. 

Ainda segundo o docente, não existe nenhum tipo de controle e pesquisa sobre nível de poluição nas cidades escolhidas para sediar grandes eventos esportivos. Outros interesses são levados em consideração e geralmente os estudos sobre o local são feitos após a escolha. 

“Alguns estudos publicados a respeito de Paris já chamavam atenção para alguns problemas climáticos, como o calor, a umidade e a qualidade do ar. O que era curioso é que já chamavam atenção para a baixa qualidade da água e que isso poderia afetar os atletas que iriam nadar. E, de fato, depois tivemos notícias de vários casos de atletas reclamarem e passarem mal depois de nadar nas águas do rio Sena.” explica o professor. 

Nos Jogos Olímpicos de 2024, diversos atletas relataram passar mal após nadar no Rio Sena. Foto: Christophe Hardouin/Flickr

A poluição atmosférica também pode ser um indicador socioeconômico que reflete na prática esportiva. O professor explica que a poluição é um marcador indireto para a não existência de equidade na prática esportiva entre diferentes países. Isso porque os países desenvolvidos terceirizam os seus serviços de produção para países não-desenvolvidos ou em desenvolvimento, terceirizando também, como consequência, a poluição. Essa transposição desencadeia uma injustiça ambiental e social que pode ser sentida também nas oportunidades relacionadas ao esporte.

“A poluição é um representativo da desigualdade econômica daquele país que consequentemente oferece menos oportunidades para os jovens se inserirem nos jogos olímpicos, se prepararem e desenvolverem a sua carreira”, explica ele. 

Rômulo Bertuzzi pesquisa, entre outros temas, a interação entre poluição atmosférica e exercício físico. Confira alguns estudos sobre a poluição em que o professor esteve envolvido: 

HUNG, ANDY ; KOCH, SARAH ; BOUGAULT, VALERIE ; GEE, CAMERON MARSHALL ; BERTUZZI, ROMULO ; ELMORE, MALINDI ; MCCLUSKEY, PADDY ; HIDALGO, LAURA ; GARCIA-AYMERICH, JUDITH ; KOEHLE, MICHAEL STEPHEN. Personal strategies to mitigate the effects of air pollution exposure during sport and exercise: a narrative review and position statement by the Canadian Academy of Sport and Exercise Medicine and the Canadian Society for Exercise Physiology. BRITISH JOURNAL OF SPORTS MEDICINE, v. 1, p. bjsports-2022-106161-20, 2023.

CRUZ, RAMON ; KOCH, SARAH ; MATSUDA, MONIQUE ; MARQUEZINI, MONICA ; SFORÇA, MAURICIO L. ; LIMA-SILVA, ADRIANO E. ; SALDIVA, PAULO ; KOEHLE, MICHAEL ; BERTUZZI, ROMULO. Air pollution and high-intensity interval exercise: Implications to anti-inflammatory balance, metabolome and cardiovascular responses. SCIENCE OF THE TOTAL ENVIRONMENT, v. 809, p. 151094, 2022.

SILVEIRA, ANDRÉ CASANOVA ; HASEGAWA, JULIO SATOSHI ; CRUZ, RAMON ; MATSUDA, MONIQUE ; MARQUEZINI, MONICA V. ; LIMA-SILVA, ADRIANO E ; GILES, LUISA V. ; SALDIVA, PAULO H.N. ; KOEHLE, MICHAEL STEPHEN ; BERTUZZI, ROMULO. Effects of air pollution exposure on inflammatory and endurance performance in recreationally trained cyclists adapted to traffic-related air pollution. AMERICAN JOURNAL OF PHYSIOLOGY-REGULATORY INTEGRATIVE AND COMPARATIVE PHYSIOLOGY, v. 322, p. 562-570, 2022.

André Casanova Silveira. Competindo na cidade de São Paulo: Efeitos da poluição atmosférica sobre a performance e parâmetros fisiológicos. 2022. Tese (Doutorado em Estudos Biodinâmicos da Educação Física e Esporte) - Escola de Educação Física e Esporte da Universidade de São Paulo, Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico. Orientador: Rômulo Cássio de Moraes Bertuzzi.

PASQUA, LEONARDO ; DAMASCENO, MAYARA ; CRUZ, RAMON ; MATSUDA, MONIQUE ; GARCIA MARTINS, MARCO ; LIMA-SILVA, ADRIANO ; MARQUEZINI, MÔNICA ; SALDIVA, PAULO ; BERTUZZI, ROMULO. Exercising in Air Pollution: The Cleanest versus Dirtiest Cities Challenge. International Journal of Environmental Research and Public Health, v. 15, p. 1502, 2018.

SILVA, R. ; MATSUDA, M. ; CORREA, A. ; PIRES, F. O. ; SILVA, Adriano Eduardo Lima ; BERTUZZI, R.C.  Exercício físico e poluição atmosférica: uma revisão acerca das respostas agudas dos sistemas respiratório e imune. Arquivos em Movimento (UFRJ. Impresso) (Cessou em 2005. Cont. ISSN 1809-9556 Arquivos em Movimento (Online)), v. 7, p. 36-54, 2011.

Por Guilherme Ike

Estagiário sob supervisão de Paula Bassi

Seção de Relações Institucionais e Comunicação

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