Demonstração em vídeo pode favorecer o aprendizado de habilidades motoras

Em pesquisa da EEFE, voluntários sem experiência com o basquete assistiram a vídeo para aprender a realizar arremessos de lance livre.

A observação pode ser uma ótima ferramenta para aprender algo novo, até mesmo quando se trata de habilidades motoras. Considerando esse princípio, uma pesquisa da EEFE investigou como pessoas sem experiência prévia com basquete aprenderiam o arremesso de lance livre por meio de uma demonstração em vídeo. 

Pesquisa investigou como pessoas sem experiência aprenderiam o arremesso de lance livre do basquete por meio da demonstração - Foto: Giulia Rodrigues

O estudo, realizado por Rafaela Cindy de Sousa Silva, sob orientação do Prof. Dr. Umberto Cesar Corrêa,  buscou analisar a demonstração autocontrolada, em que o aprendiz decide quando e quantas vezes irá observar a demonstração. Além disso, também se  considerou a influência da quantidade de prática nesse processo. Os resultados mostraram que o método proporcionou um avanço significativo no desempenho da habilidade, independente da quantidade de prática e da autonomia ou não do aprendiz.

Do Rugby ao Basquete

A pesquisadora conta que o interesse pelo tema surgiu de uma experiência pessoal: “Era jogadora de Rugby e estava com dificuldade de realizar o chute, pois estava acostumada a chutar a bola redonda. Ao me deparar com uma bola oval, senti dificuldade. Durante uma temporada no Centro de Treinamento da Confederação Brasileira de Rugby, recebia dicas e correções dos atletas sobre como realizar o movimento e também os observava praticando o chute (instrução verbal, feedback e instrução visual). Além disso, fazia vídeos para poder observar minha atuação (aprendizagem auto-observacional)”.

“Com o tempo, fui percebendo a melhora da habilidade. Esse processo me intrigou de uma forma que me levou a pensar no processo de aprendizagem das pessoas, principalmente no que diz respeito à utilização de demonstração”, completou.

 

O interesse pelo tema surgiu de uma experiência pessoal com o Rugby - Foto: Pierre-Selim/Wikicommons

Para investigar esse processo, 60 voluntários, de ambos os sexos, participaram de testes no ginásio da EEFE. Todos eram universitários, com idade média de 29 anos e sem experiência prévia com o basquete. Segundo a pesquisadora, a escolha pelo arremesso de lance livre foi feita por ser uma das primeiras habilidades que são aprendidas no basquetebol. 

Após a seleção, os voluntários foram separados em quatro grupos, sendo dois treinados com autocontrole e dois grupos yoked, que eram pareados aos de autocontrole em quantidade de vezes e momentos em que viram a demonstração, mas sem autonomia. Os voluntários também foram divididos segundo a quantidade de prática (30 e 120 arremessos).

A demonstração consistia em um vídeo que mostrava uma pessoa experiente realizando o arremesso de lance livre sob quatro perspectivas: de frente, de costas, do lado direito e do lado esquerdo.

A demonstração foi feita por meio de um vídeo que mostrava uma pessoa experiente realizando o arremesso de lance livre, sob quatro perspectivas.

O experimento foi feito individualmente durante uma única sessão, organizada em blocos de tentativas. Primeiro, os voluntários passaram pela fase de aquisição, em que viam o vídeo e realizavam a quantidade pré-determinada de tentativas. Depois, passavam ao teste de transferência, em que deveriam realizar cinco arremessos à direita da cesta e cinco arremessos à esquerda da cesta.

Os voluntários praticavam os arremessos de lance livre de acordo com o grupo em que estavam.

Melhora no desempenho e aumento de erros

Durante a análise, foram examinados a precisão do arremesso, o padrão de movimento e os erros, como não flexionar os joelhos no início do movimento ou não olhar para a cesta ao realizar o arremesso.

Todos os grupos melhoraram a precisão do arremesso na fase de aquisição e mantiveram o desempenho no teste de transferência, independente do uso de autocontrole. De maneira simultânea, houve aumento nos erros do padrão de movimento. Além disso, constatou-se que 30 tentativas foram suficientes para promover a aprendizagem.

Segundo Rafaela, uma hipótese é que os participantes possam ter criado uma referência diferente da que foi apresentada no vídeo. A pesquisadora notou que, ao longo da coleta de dados, parecia que os aprendizes “abriam​ mão” de algum aspecto do padrão de movimento observado a fim de conseguirem acertar a cesta​. 

“Nossos resultados nos levaram a questionar ‘que tipo de referência foi formada com a demonstração?’ Então, levantamos a hipótese de que a demonstração possibilitou a formação de uma referência, um modelo, com alguma diferença daquela observada, que teria sido suficiente para correção dos erros relativos à cesta”, explicou a pesquisadora. 

Abaixo, um infográfico que mostra passo a passo como realizar o arremesso:

Infográfico elaborado com base na pesquisa.

“De modo geral, os estudos que investigaram o autocontrole mostraram resultados positivos em relação à aprendizagem motora. Contudo, a demonstração pode funcionar de uma forma diversa, que ainda não foi possível identificar. Diferente do que se achava, não se trata de quantidade de prática e ter ou não autonomia no que diz respeito à aprendizagem por meio do autocontrole da demonstração”, explicou a pesquisadora.

Foto tirada durante os testes da pesquisa.

Apesar do resultado do estudo, a evolução dos grupos na aprendizagem da habilidade lance livre evidenciou que o uso de demonstração é efetivo e, portanto, pode ser utilizado em diversas outras práticas ligadas à aprendizagem de habilidades motoras.

“Tanto professores quanto treinadores e técnicos podem utilizar vídeos e outros meios de demonstração para potencializar o processo de aprendizagem de seus alunos, por exemplo. Além disso, variar entre 30 e 120 tentativas pode ser uma escala interessante para os profissionais determinarem a prática de uma habilidade visando à aprendizagem motora”, explica a pesquisadora.

A dissertação “Quantidade de prática e demonstração autocontrolada na aprendizagem de habilidades motoras” está disponível de maneira completa no banco de teses da USP, podendo ser acessada por meio do link: https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/39/39136/tde-07052024-151613/pt-br.php

Por Giulia Rodrigues

Estagiária sob supervisão de Paula Bassi

Seção de Relações Institucionais e Comunicação

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